Um grupo de pesquisadores da Fundação de Ensino Superior de Passos (Fesp), braço da Universidade do Estado de Minas Gerais (Uemg) no Sudoeste mineiro, está desenvolvendo uma pesquisa pioneira que propõe o uso do quartzito como agregado do concreto na construção civil. A exploração da pedra, existente em abundância na região, gera um descarte excessivo de rejeitos, provocando um impacto ambiental que pode ser reduzido em larga escala segundo a proposta dos pesquisadores.
O trabalho de pesquisa é conduzido pelos professores Eduardo Goulart Collares(diretor de pós-graduação, pesquisa e extensão da Fesp) e Ivan Francklin Junior, coordenador do curso de Engenharia Civil da instituição. Conhecido como “pedra mineira”, “pedra São Tomé”, “pedra Itacolomi” ou simplesmente “pedra de piscina”, o quartzito é muito usado na construção civil como revestimento. Minas Gerais é o principal produtor nacional deste tipo de rocha.
Entretanto, o processo de extração do quartzito, mesmo nas minerações que exercem sua atividade de acordo com determinações dos órgãos ambientais, gera grande quantidade de rejeitos, pois, para ser utilizado como acabamento, o material deve ser extraído em placas com padrões de espessura e comprimento. Todo o material retirado que não obedece aos parâmetros de comercialização é descartado nas pedreiras. Segundo os pesquisadores, do total do material desmontado, cerca de 90% são considerados rejeitos.
Os impactos deste descarte podem ser sentidos a longo prazo. Com o tempo, a atividade pode causar problemas como desconfiguração da paisagem, alterações no relevo, assoreamento dos corpos d’água e destruição da vegetação nativa, informam os engenheiros.
Foi a constatação dessa realidade que motivou o início dos trabalhos na Fesp. “Tive a oportunidade de visitar algumas pedreiras e pude perceber a quantidade de material de desmonte que se destina ao bota-fora”, lembra Collares. Diante disso, o professor sugeriu ao então graduando de Engenharia Civil Ivan Francklin Junior a realização de testes com o material, comparando-o com os agregados de concreto (brita) usuais na região.
Os bons resultados acabaram originando outros trabalhos de iniciação científica, bem como a dissertação de mestrado de Francklin Junior na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e seus atuais estudos de doutorado na Universidade de São Paulo (USP).
Feito para durar
O quartzito é uma rocha metamórfica, derivada do arenito. Sua composição mineralógica básica é o quartzo e ele apresenta foliação – planos paralelos, semelhantes a “folhas” –, característica que permite a ele ser considerado bom material de revestimento na construção civil. O emprego como agregado do concreto, no entanto, ainda não é usual comercialmente.
Collares lembra, porém, que quando se prepara o concreto para construir uma edificação, planeja-se que ele seja “firme como uma rocha”. “O agregado ou brita é constituído, simplesmente, por fragmentos de rocha e tem a função de exercer esse papel, como componente do concreto”, detalha.
Na mistura, segundo o pesquisador, o material é responsável por 60% a 80% do volume e pode exercer influência sobre a sua resistência, estabilidade e durabilidade. Quanto mais homogêneo, duro e resistente for o mineral, melhor seu aproveitamento como agregado na mistura para o concreto.
Para avaliar a possibilidade do quartzito como agregado, foi analisada, no estudo, uma série de características ligadas ao resultado da mistura obtida quando produzido o concreto, como as propriedades do concreto nos estados fresco e endurecido, a resistência à compressão, à abrasão e ao impacto, dentre outros elementos. Para realizar os testes, os pesquisadores observaram critérios de referência da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Propriedades físicas, como massa específica, porosidade e absorção de água, além de aspectos relacionados à forma e à alterabilidade também foram verificadas.
Sudoeste demonstra potencial
A equipe de pesquisa visitou 13 minerações no Sudoeste mineiro em Alpinópolis, Capitólio, São José da Barra, São João Batista do Glória e Guapé. Após a verificação de aspectos litológicos e testes de resistência, foram escolhidas cinco minerações – uma em cada município – para estudo mais aprofundado.
“A análise inicial nos possibilitou distinguir ao menos dois grupos de quartzitos que passamos a chamar tipo 1 e tipo 2. O primeiro, bastante foliado, já é usado como pedra de revestimento. O tipo 2, mais maciço, geralmente é desmontado e descartado sem fins comerciais. Esse último constituiu, efetivamente, o objeto principal da pesquisa”, detalha Collares.
Os pesquisadores garantem que, na comparação com a brita tradicional, os agregados de quartzito tiveram resultados satisfatórios nos índices apresentados por modelos acadêmicos de referência e aos parâmetros da ABNT. “Os ensaios realizados com as amostras dos bota-foras apontaram que elas atendem às recomendações para uso como agregado, classificando-se com nível ‘bom’ ou ‘excelente’ nos critérios verificados”, conta Francklin Júnior.
Concretizando possibilidades
De acordo com Eduardo Collares, ainda é preciso trabalhar aspectos específicos, principalmente no que diz respeito às possíveis reações do agregado com o cimento. “Com o aprofundamento dos estudos e o apoio de instituições que contribuem para a movimentação da economia regional, a comercialização do mineral pode tornar-se economicamente viável e, com isto, contribuir para solucionar problemas sociais, econômicos e ambientais que atingem o setor minerário do Sudoeste de Minas Gerais, em especial no que se refere aos quartzitos”, aposta.
Além de representar uma alternativa econômica a outros materiais, do ponto de vista ambiental, o uso do quartzito contribuiria para reduzir os impactos ambientais negativos. “No que diz respeito ao aspecto econômico, o mercado passaria a oferecer um novo tipo rochoso para uso na construção civil, com custo mais baixo, uma vez que não demandaria os encargos necessários para a abertura de uma nova jazida”, antevê Francklin Júnior, para quem o novo foco poderia, até mesmo, revigorar as minerações, gerando novos postos de emprego e resgatando outros.
Para que essas mudanças se concretizem, Collares defende a necessidade de mobilização social e política, além do acesso dos mineradores a oportunidades de realizar estudos específicos de seus materiais. “Uma de nossas propostas é criar, na Fesp, um centro tecnológico de pesquisas em materiais rochosos para construção civil. Assim, poderemos analisar e validar os produtos de cada mineração”, adianta. Os pesquisadores acreditam que pode ser esse o caminho para a certificação do material e seu consequente uso comercial, com toda a segurança exigida pelo mercado. (Agência Minas).